Quebrando o Encanto?

Percy Jackson
De Rick Riordan
“(...) Ele tem que devolver o raio a mim em 14 dias, até a meia-noite do solstício de verão, ou teremos uma guerra (...).” - Zeus
(Percy Jackson e o Ladrão de Raios - Filme)

O caminho até a obra
Percy Jackson chegou diretamente do Monte Olimpo para minha casa. Foi em novembro de 2008. E assim que abri a pequena caixinha de correio e manuseei o livro, me encantei com ele. Além da sua capa que brilhava no reflexo da luz – assim como a luz de um raio –, a diagramação era leve e agradável para leitura.
Logo descobri que Percy Jackson divertia não apenas com as suas aventuras, mas com os títulos dos seus capítulos – Grover de repente perde as calças; Minha transformação em Senhor Supremo no Banheiro; Um poodle é o nosso conselheiro; Um Deus compra cheeseburgers para nós – que acompanhavam o texto descontraído do autor Rick Riordan. 

O leitor precisava ser muito mal-humorado para não gostar da série. Brincadeiras a parte, recebi o primeiro volume da própria editora, a Intrínseca, que preparou um material bem criativo para divulgar a obra – CD com fotos, releases, marcador de livro – premiada em várias instituições dos Estados Unidos.

Repleto de aventuras com Deuses, Semi-Deuses e Monstros, a série trazia história criativas, além de uma completa aula de História sobre Mitologia Grega do Professor e Autor Rick Riordan. Durante a leitura, podíamos nos deparar com Benevolentes em uma banca de frutas, no acostamento de uma estrada ou com um Minotauro caminhando pelo campo. Era também preciso cuidar-se ao caminhar em um Empório de Anões de Jardim, pois a dona do estabelecimento podia ser a Medusa. 

Foram quatro livros e uma longa caminhada pelo mundo dos Deuses, que apenas os leitores de Percy Jackson foram capazes de conhecer, já que não é permitido a nenhum mortal ver através da névoa.

Embarcando em uma nova jornada
A história do filho de Poseidon é repleta de seres mitológicos que Rick Riordan insere na narrativa com muita criatividade.

Como conseguimos enxergar através da névoa, ao lado de Percy, sentimos as mesmas sensações que nosso herói, seja de curiosidade - quando Grover revela ter um traseiro peludo e cascos fundidos no lugar de pés - ou de apreensão - quando estamos no ônibus lutando com três Fúrias com asas de morcego e um chicote chamejante nas garras. Sem falar nos encontros apavorantes com uma Quimera no alto de uma plataforma e com o Barqueiro que leva as almas dos mortos para o Mundo Inferior.

É tudo muito divertido. E ver nossos herois e monstros saltando das páginas para às telas do cinema é, no mínimo, empolgante. Mas há um personagem silencioso que está tão vivo e em constante movimento tanto quanto seus campistas. O Acampamento Meio-Sangue. Com suas colinas, pequenos bosques, riacho e campos de morangos embaixo de um céu azul, o lugar é familiar para nós que, durante algumas semanas, emergimos neste mundo. Caminhamos pelo anfiteatro, andamos de canoas pelo pequeno lago, praticamos arco-e-flecha, montamos em cavalos, jogamos volei, enfim, nos tornamos verdadeiros campistas.

Por isso, com o passar das páginas ficamos tão familiarizados, não apenas com o Acampamento, mas com todos os moradores dos Chalés, que passamos a vestir a camiseta laranja-claro do acampamento e a treinar ao lado dos nossos heróis.

Marcando um encontro
O mundo mitológico de Percy Jackson deixou o Acampamento Meio-Sangue em 2010, quando o estúdio 20th Century Fox e o diretor Chris Columbus - que já voara em uma vassoura para o mundo bruxo de Harry Potter - levou para as telas do cinema a história do filho do Deus Poseidon.

Conhecer Grover, Quíron, Annabeth, Gabe Cheiroso, Sally Jackson, Luke, Clarisse, entre muitos outros personagens criados por Riordan foi tão divertido quanto visitar o Oráculo no sótão; visitar o Empório de Jardim da Tia Medusa; passar alguns dias no Cassino Lótus e conhecer Caronte, o Barqueiro que leva as almas dos mortos para o Mundo Inferior.

Mas percorrer as estradas dos Estados Unidos foi uma grande aventura. A viagem não foi tranquila, pelo contrário, encontramos com muitos seres assustadores e Deuses bem temperamentais, mas desde quando uma missão é fácil?

Você irá para o oeste, e irá enfrentar o Deus que se tornou desleal.
Você irá encontrar o que foi roubado, e o verá devolvido em segurança.
Você será traído por aquele que o chama de amigo.
E, no fim, irá fracassar em salvar aquilo que mais importa.
(O Oráculo)


Explorando novos caminhos
Assim como Harry Potter, personagem da autora J.K. Rowling, Percy Jackson não sabe que é um garoto especial. Um menino com poderes e pais que o diferencia de outras crianças e o torna um chamariz de monstros e deuses. Mas a comparação entre o bruxinho e o meio-sangue termina por aí.

Nosso herói, filho de Poseidon, não é um pré-adolescente de doze anos, como na obra, mas um adolescente comum que não arruma encrencas com os amigos do colégio, enfrenta o padrasto e não está muito preocupado com os deuses e seus problemas no Monte Olimpo.

Ao contrário da adaptação da obra de Harry Potter para os cinemas – com o primeiro e o segundo filmes, também sendo dirigidos por Chris Columbus – a franquia de Percy Jackson não seguiu, com fidelidade, cada cena e trama da história. O diretor acrescentou, criou e cortou passagens, o que gerou reclamações. Muitos leitores da série torceram o nariz.

A história já se inicia com um Percy mais velho que não descobre sozinho quem é o seu pai. Essa é uma das melhores passagens do livro, pois Percy tem conhecimento de seus poderes de uma forma bem inusitada: dentro de um banheiro. Há também o relacionamento dele com sua mãe, mais explorado nas páginas. E um detalhe que aborreceu os fãs. Annabeth é uma garota de cabelos claros e não castanhos escuros. Parece um pequeno deslize? Mas não é que os leitores notaram e reclamaram! Não querendo comprar briga e agradá-los, no segundo filme da série – Percy Jackson e o Mar de Monstros – a atriz que interpreta a personagem, Alexandra Daddario, pintou os cabelos de loiro.

Mas há de admitir que o trio escolhido para recuperar o raio-mestre de Zeus – Logan Lerman, Brandon T. Jackson e Alexandra Daddario, respectivamente, Percy Jackson, o sátiro Grover e a filha da Deusa Atena, Annabeth – são uma equipe bem entrosada e divertida. 

Adaptando para o cinema
Quando Percy Jackson subiu a colina e entrou nas terras do acampamento meio-sangue, uma legião de fãs entrou ao lado dele. Como seria o acampamento? E os heróis? Quando veríamos Luke, Annabeth, Clarissa e tantos outros meio-sangues em batalha?

‘Percy Jackson e o Ladrão de Raios’ conquistou o público jovem, mas não arrecadou na bilheteria mundial o sucesso aguardado pelo estúdio. A 20th Century Fox esperava um sucesso maior de público. Afinal, o filme tinha o conceituado diretor Chris Columbus que havia dirigido os dois primeiros filmes de Harry Potter. Uma das mais rentáveis franquias do cinema. Em 2013, o estúdio deu o aval para filmar o segundo livro da série – ‘Mar de Monstros’. Infelizmente, a resultado não foi, novamente, o esperado pelo estúdio. 

Uma pena, pois Percy Jackson traz em suas páginas, um mundo repleto de seres complexos e belos. Deuses, Heróis, Monstros, Sátiros, Ninfas e outros mitos. Nosso protagonista enfrenta Deuses trapaceiros, Benevolentes, Górgonas e Quimeras que o persegue e preparam, em todos os capítulos da série, armadilhas para que ele não chegue a tempo, em seu destino. Ao lado dele, conhecemos a imensidão do fundo do mar, a beleza do Olimpo e a escuridão das profundezas da terra. 

Uma série divertida, ágil e criativa que merecia uma nova chance nas telas do cinema.