Contando um Conto, Os Intrusos

As primeiras linhas do conto Os Intrusos surgiram em abril de 2020. Quando todos nós estávamos trancados em casa, sem perspectiva de quando voltaríamos a nossa rotina. À espera de algo. E me lembro dos sentimentos de impotência, medo, dúvida e tristeza. Para enfrentar esses dias, escrevi e escrevi muito. Todos os dias, durante muitas horas e meses. Mas eu saía. Era minha tarefa ir ao supermercado e a farmácia. No início, quando não sabíamos nada sobre o vírus, usávamos máscaras e luvas.

Ainda me lembro do medo que todos sentiam quando estavam nos corredores do supermercado. Se alguém entrava em um corredor, o outro aguardava a sua vez. E tudo era feito em silêncio, sem que ninguém precisasse dizer nenhuma palavra. Falar, tossir, espirrar, “respirar” era algo proibido. Como se fosse proibido. No ar havia apenas o silêncio. O som? Apenas das rodas dos carrinhos.

Quando chegava em casa e fazia todo aquele processo de descontaminação, pegava meu caderno e transformava todas essas sensações em palavras. E as primeiras palavras que escrevi, no primeiro dia em que saí de casa, dão início ao conto Os Intrusos.

“(...)Hoje era o meu dia de sair.

Precisamos de mantimentos.

O vento que perdurou noite adentro cessou. No seu lugar, apenas uma brisa suave e quente. É normal, pois estamos na primavera.

Suspiro. Ainda sinto falta do tempo em que sair era uma decisão apenas minha. Mas agora, com a presença dos Intrusos, é preciso pedir permissão. Eu recebi a minha hoje, pela manhã. E com ela, minhas tarefas(...).”


Palavras que permaneceram no conto, sem que eu mudasse sequer uma vírgula.

História que será o sétimo conto da série Através da Neblina. Mas enquanto ele não chega, vamos conhecer um pouco dela?

Ao primeiro olhar, a Vila da ilha Areia Branca parece estar deserta. Parece. E Lily sabe disso quando sai do abrigo e pedala por suas ruas. Acompanhando ela estão os drones, que tudo veem. Exceto os Intrusos. Visitantes que chegaram há alguns meses, pousando suas naves no mar. Ninguém sabe o que eles desejam. Mas há um lugar na ilha por onde eles não caminham, a Fronteira. Por que? Descobriremos no dia 21 de dezembro de 2022.